As brumas de fumaças
espessas que bruxuleiam constantemente os derredores do Umbral
parecem como vapores que saem das fendas da terra, trazendo vapores
quentes. A sensação é, no entanto, um tanto arrepiante, pois o
cheiro e o frio que elas exalam provocam calafrios e nos fazem correr
em direção oposta.
Na imensidão do espaço
escuro e esquecido de todos, fica a vívida certeza de que algo
diferente poderia ter sido feita em tempo remoto, quando encarnado.
É! Não soube
aproveitar bem a oportunidade assumida na Terra e as consequências
que eu próprio designei para meu transcurso na Espiritualidade me
calcinam a Alma, que chora e geme, ri e lastima a própria sina
assumida.
Quisera saber dos
detalhes vindouros e eu jamais teria cometido tantos desatinos;
jamais teria atentado com tamanha perfídia contra a própria vida.
A distância da faca ao
peito é diretamente proporcional a mil vezes ao tamanho dos espaços
lúgubres e desconexos que a minha própria coragem engendrou. Tudo
faz crer que os quarenta centímetros que separavam a adaga que
perfurou meu peito correspondem a uma vastidão ininterrupta de
quatrocentos quilômetros de regiões ora enlameadas, ora calcinadas
pelo calor escaldante do deserto, outra ora impregnadas de umidade,
cheiros fortes, gritos e gemidos apavorantes que castigam
abruptamente a paciência e a tolerância.
O Umbral é uma extensa
região inóspita que calcina as Almas, mas que ao mesmo tempo nos
arranca, tal como o médico que extrai os carcinomas, todas as nossas
paixões materiais e sentimentos de vaidade da carne. A arrogância,
aqui nesse vale de lágrimas, de nada vale. A esperança é a única
força a animar e em afirmar, no íntimo do coração perfurado e que
vez por outra ainda sangra, que sairemos desse lugar desolador.
Aqui não sei contar a
passagem do tempo e menos ainda se é dia, se já foi dia alguma vez,
pois o ambiente está em permanente mutação abrupta da penumbra
para a escuridão absoluta.
E quando vozes gemem ao
longe, podemos ter um pouco de privacidade e certa tranquilidade para
descansarmos da caminhada incessante para lugar algum. Pois quando se
ouvem gritos e se percebem esfarrapados correndo desenfreadamente,
tem-se que correr, e correr muito e com todas as forças possíveis,
sem olhar para traz. Turbas de entidades nos achincalham com tal
voracidade a ponto de nos deixar completamente esgotados e com
extenuantes dores pelo corpo todo. Eles aparecem como imagens de
figuras horripilantes, rostos desfigurados, e exalam uma atmosfera de
ar gelado que ao nos envolver, faz tremer de frio o corpo inteiro.
Fugir, como percebes,
nem sempre é possível. Essas turbas nos envolvem e nos carregam por
longas regiões num cansativo joguete de intenções descabidas.
E quando se consegue
alguma trégua da dor, do frio, da fome, da turba ensandecida, busco
na oração o aconchego da esperança de que o dia de minha saída do
Umbral já está próximo.
Malaquias
Psicografado em 18 de
janeiro de 2012.
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