Ao sairmos do Observatório, havia uma entidade na rampa de acesso que veio ao nosso encontro. A entidade e o Bartolomeu se cumprimentaram e em seguida fui apresentado a ela. Tratava-se do irmão Marcos, que nos conduziria até o porto da cidade. Local onde iniciaríamos, juntamente com mais um irmão, para a atividade de resgate.
Marcos era muito atencioso. Enquanto caminhávamos por uma extensa avenida, ladeada de jardins e árvores frondosas, ele explicava sobre as casas e prédios da cidade Vida Nova. Disse que as atividades envolvendo os trabalhadores são dos mais ásperos e os serviços de resgates nem sempre atingem o objetivo desejado, pois os irmãos conservam muitas necessidades relativas à alimentação e medicina que praticavam na Terra, além de muitos persistirem arraigados em pensamento infantil. Enquanto falava, apontou para sentarmos num banco, onde aguardaríamos a condução que nos levaria até o Porto da cidade.
Não demorou muito e logo apareceu suspenso no ar o nosso transporte. Era semelhante ao que já havia visto em outra cidade espiritual. Tinha o tamanho de dois ônibus e parecia ser feito de um material metálico. As janelas eram formadas em um único vidro e ocupava toda a extensão de cada lateral.
Sentei na janela para visualizar a cidade, mas a velocidade não permitia distinguir suas construções. Por outro lado, Marcos e Bartolomeu me chamaram a atenção para a atividade que iríamos desempenhar.
Marcos logo levantou e informou que havíamos chegado ao Porto. Pela janela vi um gigantesco rio. Quase não dava para reparar a outra margem, de tão distante que estava à outra margem.
Bartolomeu teceu maiores explicações sobre minha presença na cidade e na atividade que desenvolveriam.
Luciano me cumprimentou e comentou sobre o resgate.
-Nosso irmão que será resgatado hoje, já vem sendo preparado há algum tempo. Ele está localizado numa região de mata densa, localizada num plano mais elevado das regiões mais densas e sofredoras do umbral. Tenho fé que hoje ele virá.
Marcos complementou as explanações.
-Nós estamos trabalhando há quatro anos com esse irmão. Ele desencarnou de uma tribo que desconhecia a civilização. Vagou algumas semanas nas regiões sofredoras e conseguiu se afastar da densidade. Atualmente ele está numa localidade onde continua a desenvolver as mesmas atividades de caça, pintura corporal, rituais religiosos e demonstrava hostilidade quando da aproximação dos irmãos desejosos em auxiliar. No decurso desses quatro anos, fomos estabelecendo contato visual para ele ir se acostumando com a presença da equipe de resgate. Nas duas últimas semanas nós conseguimos estreitar relações. Já estabelecemos longas conversas.
Fiquei curioso com a situação e questionei sobre a situação de um nativo estar nessa condição. Marcos explicou que o caso não tinha exclusividade.
-Irmão Charles, apesar de alguns dos nossos irmãos silvícolas desencarnarem e estacionarem em regiões do umbral, eles não demonstra pensamentos de maldade. A racionalidade que lhes domina, caracteriza o ser acuado que diante do desconhecido procura maneiras para se defender. Muitos deles não trazem pensamentos obscuros. São nossos irmãos menores que estão evoluindo em direção a Deus. Mas temos que ir.
Caminhamos por uma calçada, de uns cinquenta metros de largura, até chegar à margem do rio. Ali havia uma espécie de lancha. Porém, a frente dela era retangular. Notei que naquele local havia grande movimentação de pessoas. Caminhavam ao longo de toda a extensão do rio, pelo que pude ver, onde existia uma espécie de pista de passeio com pequenas árvores a produzirem sombra e diversos canteiros de flores que ladeavam o rio e essa pista.
Marcos convidou-nos a subir no “Hidrovel”. Comentou que foi com o recurso do “Hidrovel” que estabeleceram a aproximação com o irmão que iríamos resgatar.
Perguntei como foi realizada a aproximação.
Marcos disse que ela ocorreu gradualmente.
-Durante várias vezes, nós passamos próximo do local onde nosso irmão está localizado. Fizemos um pouco de barulho na água para chamar sua atenção. Depois passamos a ficar parados, numa certa distância da margem, possibilitando que ele nos observasse os movimentos. Conforme o tempo passava e percebendo a sua aceitação, fomos nos aproximando da margem. Quando chegamos à margem, não demorou muito para esse irmão nos puxar para sua oca.
Nesse instante Luciano pediu para sentarmos, pois iria levantar o “Hidrovel”. Afastamos-nos uns vinte metros da margem. De repente vi jatos de água correndo pela lateral do “Hidrovel” e jorrando a uns dez metros para frente. Em seguida começamos a se elevar do rio, enquanto que o esguicho desaparecia. Ficamos, aproximadamente, um metro da superfície do rio. Bartolomeu disse que desceríamos o rio de foram tranquila e segura.
Foi grande a velocidade atingida por aquele veículo. Conforme avançávamos rio abaixo, passei a notar que tanto a cor da água, como também o cheiro, destacava que estávamos longe da cidade. A água não era mais límpida. Seu aspecto era de um verde musgo. O cheiro, que antes tinha o aroma de flores e mel, agora era de putrefação. No ar era possível sentir uma umidade que parecia grudar na roupa.
Depois de uns dez minutos chegamos ao destino. Paramos na margem, bem diante de uma mata densa. O céu estava carregado de nuvens cinza e pouca luz do sol passava por entre as nuvens. Isso aumentava a sensação de inóspito. Olhando para aquelas árvores e vegetações, tive uma sensação um pouco desconfortável. As sobras produzidas por elas pareciam grutas escuras.
Bartolomeu, percebendo meus pensamentos, comentou sobre a situação.
-Charles, fique tranquilo. Aqui nada pode nos atingir. Estamos sobre o amparo do Alto, que nos observa com muito amor. Mas vamos adequar sua roupa para ter condições de andar nesse local. O que acha agora?
Olhei para meus pés e notei estar com botas que vinham até o joelho.
-Estou pronto. Mas ainda com certo receio.
Luciano interveio.
-Não carece de receios. Nosso irmão já está aguardando a visita em sua oca. Podemos ir tranquilamente.
Quando descemos do “Hidrovel”, notei que eu era o único em que os pés afundavam um pouco naquela gramínea, coberta pelas folhas secas das árvores.
Mas não conseguia me desligar do medo. Por vários momentos, grunhidos e outros sons que pareciam de aves rompiam o silêncio. O vento fazia as árvores estralarem.
Caminhamos uns quinze metros mato adentro, até chegar numa pequena área sem árvores. Ali estava a oca. Porém eu não enxergava ninguém.
Marcos disse para entrarmos na oca.
Ao entrarmos, reparei um cheiro forte de fumaça. A oca tinha uns dez metros de diâmetro, e conservava certa penumbra em seu interior, de forma que eu não consegui ver onde estava o ente que seria resgatado. A única coisa que vi foi um banquinho encostado na parede da oca.
Luciano cumprimentou a entidade, como se ela estivesse ao meu lado ou nas minhas costas. Olhei ao meu redor e questionei o Bartolomeu sobre a situação. Antes que ele respondesse, senti uma batida em minha perna. Olhei e notei que aquele banquinho foi colocado junto de mim. Meu coração disparou e a sensação de medo aumentou.
Bartolomeu, imediatamente percebendo meu desconforto, colocou a mão em minha nuca e disse:
-Charles, acalma essa angustia do desconhecido. Nosso irmão colocou o acento para você, em sinal de afeto ao novo visitante. Ele está ali.
Ao apontar para a área escura que estava na minha direita, vi a entidade toda pintada de preto.
Bartolomeu continuou falando.
-Charles, sente para retribuir a gentileza de nosso irmão.
Enquanto Bartolomeu falava comigo, Marcos e Luciano se aproximaram da entidade e começaram a conversar com ela.
Durante a conversa entre os três, a entidade disse que estava disposta a ir embora com eles.
Enquanto os três conversavam, eu fique sentado, recebendo o amparo de tranquilidade de Bartolomeu, que mantinha sua mão na minha nuca.
Marcos passou suas mãos no rosto da entidade e em todo o seu corpo, removendo a tinta. Ao terminar, Luciano, que já segurava um lençol aberto, cobriu com o mesmo a entidade. Nisso orientou para irmos ao “Hidrovel”.
Retornamos para o “Hidrovel” levando a entidade, que subiu prontamente no mesmo. Enquanto subíamos, Marcos disse:
-Hoje resgatamos mais um irmão. Nosso Natal será de grande felicidade.
Nosso retorno parece que foi muito mais rápido que a ida. Quando descemos do “Hidrovel”, Luciano e Marcos agradeceram a minha presença e me desejaram felicitações pelo Natal. Da mesma forma se despediram de Bartolomeu. Depois disseram que levariam a entidade para o hospital, onde receberia os tratamentos iniciais.
Bartolomeu também agradeceu minha presença e acrescentou:
-Charles, hoje sua participação foi importante para a atividade de resgate. Nossos estudos estão lhe proporcionando um aprofundamento no entendimento da espiritualidade. Hoje, véspera de Natal, a espiritualidade se recolherá em preces. Durante a noite e a madrugada, a espiritualidade desenvolverá coletivamente vibrações de paz e amor para a humanidade. Aproveita também esse momento para elevar suas preces ao Pai Celestial. Que seu Natal seja iluminado pelas bênçãos de nosso Pai. Agora retorna ao corpo, que já está tarde.
Bartolomeu levou suas duas mãos sobre minha cabeça e imediatamente fez-me retornar ao corpo. O relógio marcava 9h10min.