Ao entardecer do dia, tenho a noção
de que os Anjos cantam ao Senhor!
Fui apóstolo do Cristo. Mas em
outro tipo de seara.
Naquela época acreditávamos na
imortalidade da alma. Mas que com a chegada da morte a Alma
ascenderia ao conhecimento universal, deixando a ignorância de lado
e assumindo o conhecimento imanente de Deus em cada coração e
mente. Ou seja, cada um que morresse, mesmo tendo parcos
conhecimentos, seria incluído na Consciência Divina e teria todos
os mistérios e tudo que era desconhecido, revelado. Entraria na
graça de Deus e num passar de estágio, lhe seria como que ligado em
todo o conhecimento até então nunca lhe revelado ou nunca lhe
instruído.
A morte seria a revelação sublime.
E tudo o que era ignorado seria conhecido.
Ora só! Ledo engano de uma vaidade
desejosa de atalhos no progresso do Espírito.
Nada é assim. Tudo se encaminha a
passos certos e coordenados. Sem saltos!
O conhecimento não é revelado. O
conhecimento é adquirido pelo trabalho do Espírito, pelo trabalho
do Homem e pela manifestação da Alma de cada ser.
Vendo por esse ângulo, pelo viés
do Espírito, vemos cada Alma, de cada Ser, em constante processo de
animação e estímulo, um estímulo as vezes que nos parece
invisível, mas que atesta a vontade de Deus. Sim! É Deus a
estimular cada Alma ao progresso.
De outro instante, vemos e somos
levados a concordar ou até mesmo discordar com as vontades de cada
Alma. Ai conversamos e sem que muitos se deem conta, até influímos
nas decisões assumidas. E mesmo assim, nesse processo de conversa
íntima, está a vontade manifesta de Deus na atividade progressiva
de cada Espírito.
Pois bem! A vontade manifesta sempre
se depara com o livre-arbítrio de cada Alma, de cada Espírito, e o
conhecimento revelado que tanto debatíamos em nossos cadafalsos,
nada mais era, e nada mais deixou, do que a nossa mais absoluta
ignorância, de um lado (de considerar o estudo estafante), e de
absoluta desnecessidade, de outro (pois a morte atalharia esse
trabalho, desde que se acreditassem e se imolassem ao Pai Celestial).
Agora sim! Agora sabemos que o dito
revelação nada mais é que o trabalho, dedicação e esforço
pessoal de cada Alma. Assim se constrói o caminhar seguro e reto em
direção ao progresso Divino.
Irmãos! A pira, em diversas
oportunidades, foi acesa com o propósito de purificar.
Na verdade as chamas que
carbonizaram pessoas serviram muito mais para nos indicar o caminho
quando a morte gelou nossos corpos.
Ao longe víamos as chamas; mas os
gritos de blasfêmias, de ódios e condenações, nos fez fugir
diversas vezes – não sei quantas – da ajuda do Alto.
Formamos nossa irmandade em terras
áridas, em meio aos combalidos e incrédulos. E em nossas discussões
e debates, chegamos a contestar a existência do Bem e mesmo a
existência de Deus.
Não consigo precisar quanto foi o
tempo que permanecemos em regiões tão sombrias e inóspitas.
Mas tudo acabou quando até nós uma
caravana chegou. Tinhamos a certeza de não estarmos sós, pois em
algum lugar estariam outros nossos colegas de fé que morreram antes
de nós.
Se nós não os encontrávamos em
nossas infinitas excursões, tinhamos a esperança de que eles nos
encontrariam.
E foi assim que ocorreu. Em certa
tardinha, quando a luz parecia deixar todo o local num braseiro,
vimos ao longe uma cruz em chamas. Pensamos em mais um ato de
sacrilégio feito por hereges contra nosso Pai. Mas logo o cantorio
de louvor nos levou a apontar em outras possibilidades.
A caravana foi diminuindo sua
distância de nós. E naquele solo calcinado e avermelhado, seco como
o deserto e entre diversos seres, que para nós eram a réplica
perfeita dos seres infernais, fomos percebendo que algo diferente de
tudo o que já havíamos passado estava ocorrendo. Enquanto aqueles
seres infernais corriam esbaforidos e horrorizados da caravana, nós
fomos tomados de um sentimento de alívio.
A caravana não tinha nenhuma cruz
em chamas. Ao vê-la mais próxima, percebemos tratar-se do brilho,
de um dourado que refletia uma luz incandescente.
As pessoas que compunham a caravana
também eram diferentes. Todas elas usavam vestes limpas que nos
fizeram lastimar os trapos imundos que usávamos para cobrir nossas
vergonhas.
O cheiro perfumado da caravana
contrastava com o odor pútrido de nossas feridas que, em carne viva,
purgavam larvas que serviam como nosso alimento.
A caravana chegou próxima a nós e
um dos seus integrantes dirigiu-se a nós.
Nossa reação, de vergonha, foi em
nos escondermos entre umas rochas; e dali estabelecemos o diálogo
inicial:
- Quem são vocês que trazem essa
cruz de ouro?
- Somos caravaneiros do Cristo. Em
nome da Virgem Maria estamos a caminhar por essas terras. Fomos
informados de Homens Santos que clamam por Deus.
- E como saberemos que vós sois
quem dizem ser e que estão aqui por intervenção da Virgem Maria?
- Filhos! Nossa Mãe, a Mãe de
nosso Senhor Jesus Cristo, sabe perfeitamente o que cada um dos seus
necessita. Estamos aqui para fazer valer a máxima de nosso Mestre, o
Cristo: Ama o próximo como a si mesmo e a Deus sobre todas as
coisas.
- Assim somos tentados a acreditar
em tuas palavras. Mas como saberemos que vós não é um dos
discípulos de Satanás a querer nos persuadir ao erro. Dê-me uma
prova de que falas a verdade.
- Meus Irmãos! Não convém tanto
palavrório. Vós todos se encontram aqui já há muito tempo. Somos
os primeiros seres que lhes chegam para falar em nome de Deus. Vós
já se encontram cansados. E foi nos últimos dias que vossas orações
se desembrenharam da matéria.
- Ainda não confiamos em suas
palavras.
- Não há problema. Ficaremos um
tempo aqui. Vamos orar para o nosso Pai Celestial e se desejarem
participar, são nossos convidados.
Ficamos atrás das rochas
confabulando sobre diversas possibilidades. Mas a cantoria e o louvor
passaram a nos tocar profundamente a Alma.
Nossa! Tudo passou a ter um
sentimento diferente do orgulho que trazemos em nosso íntimo. O
egoismo que nos catapultou para honrarias terrenas, agora estavam
completamente esfacelados diante da caravana. E as rochas que estavam
servindo de nosso esconderijo, passou a revelar-se como o nosso
estágio quando deixamos a Terra.
Sim! É duro reconhecer! Eramos
seres brutos que necessitávamos de muito trabalho.
Não recebemos a revelação e o
conhecimento universal com a morte. Nem tão pouco assumimos a
condição de Anjos ou ocupamos nosso lugar à direita de Deus Pai.
Vimos ali, naquele momento, que a
morte nos deixou exatamente como éramos na Terra. Brutos que
utilizaram de seu orgulho, vaidade e egoismo para impor uma ordem.
Vimos que essa ordem não se configurou no Bem.
Para saldar nossas dívidas carnais,
as lamúrias de nossas Almas estavam apenas começando. Lamúrias de
vergonha em não ter dado ouvidos ao Bem que deveríamos ter feito.
Negamos a humildade e caímos na escola do Espírito, onde a
consciência nos julga a todo o momento, mas que com a interseção
de nosso Pai e dos Bons irmãos, o esquecimento se faz como um
bálsamo revigorante. E só aos poucos, sem sobressaltos, as
lembranças de passado perfídico vão se levantando.
Obrigado a todos os queridos
caravaneiros que pacientemente nos acolheram.
Agora, no Plano Espiritual, pedi o
perdão para cada uma Alma que martirizei.
E quando algo sombrio surge em minha
consciência, revelando mais uma perfídia, a vergonha me faz
lastimar e oro ao Pai que logo envia a ajuda necessária para eu
suportar.
Sou um devedor! Não tenho muito
para dar. Mas como Irmão e Filho de nosso Pai, venho pedir o perdão
dos que prejudiquei.
Em nome do Pai, quero ajudar aos que
mais precisam.
Vamos juntos orar ao Pai!
Um Bispo de Marselha.
Psicografado em 04 de fevereiro de
2013.